Adormeci a contar os soluços do vento, prolongando-o em espasmos de realidade, debruçado-me na penumbra da janela. Era confortável o clamo e derramado silêncio que se despia até meus pés. Havia uma estranha confortabilidade de me ter ali sozinha, confrontando-me comigo própria, mas esse era apenas o sinal de que estava ali e que algo era possível. Pensava que não iria durar muito esta estadia, este aprisionamento a uma morte prematura que faço nascer cada vez que me movo, a uma distância entre a minha pessoas e o espaço escuro que é somente vazio. Resgurado-me com o Inverno lá de fora. Sou o frio que chora o Inverno de agora e analiso os estádios da minha vida.
O silêncio estava cómodo. Coloquei uma música suave mas que se tornou num mero desconforto, como tudo o resto a minha volta. Acordes desordenados, ritmos largados a um acaso faziam da minha partitura um eterno fechar de olhos, uma eterna falta de controlo, uma insegurança. Fechar os olhos já não era tranquilidade, já não era aparente calma… Peguei num livro abandonado que se encontrava na cómoda, e saboreando página a página, tornei-me numa mera letra abandonada e liberta de cada palavras. As imagens à minha frente eram só devaneios cínicos e egoístas de me ver a mim mesma sozinha em vários sítios. Pensava nas ondas de um mar qualquer que desgastam a terra que tem o trabalho de se formar. Inquietudes passageiras talvez façam de mim este animal turbulento que é mais imagem do que paisagem. Sentia-me feliz ao ler cada palavra, ao sentir cada emoção num efeito autêntico de catarse e as palavras caiam como gotículas, abandonadas e deixadas. Tão somente restadas, quanto quantificadas. Sou mais uma delas, eu sei, mas a diferença é que me formo em todas elas e ao reflectir-me nessa mancha sou a paisagem que as integra. Deslizo entre a vontade de ser e o que já sou, esse pincel mascarado que com as lágrimas da cor pinta a sobeja tristeza que se adeja. As linhas inquietas desse todo igual. Mera paisagem, mera pintura desfigurada, da mais certa a mais verdadeira…
domingo, 17 de outubro de 2010
segunda-feira, 11 de outubro de 2010
Sombra de Espelhos
Os minutos pesam silenciosamente a tua chegada numa inquietude atroz. Roubam a vontade de ser ao tempo, demorando-te enquanto não registas a tua presença junto das minhas pernas frias. Resta o som demorado a meu lado, o Inverno estival célere que se cansa de ser ele mesmo por não sentir o afago dos teus olhos. Às vezes tudo funciona assim, nesse mecanismo quase resoluto em fazer aceitar as coisas que nos perseguem na vida, nesta existência em mim já marcada à nascença, pela diferença de ser quem sou.
Desafogo saber que voltaste. Que o vento escuro que norteava a minha estrada, era apenas nevoeiro claro que firmava o teu caminho. Ouvia de mansinho os teus pés de prata, aconchegando-me com a sombra que a tua imagem delineava no meu corpo. Tudo são desvarios cansados que formas, sem dizer uma única palavra. Ventos sombreados entre dedos abandonados em recordações pálidas por nunca viverem em si mesmo, cansadas.
Revolto a almofada, símbolo de minha castidade pela tua ausência, e desnudo pensamentos só nossos, entre lençóis ou nas passagens frias que a realidade cria sem sentirmos. E esgotante ter que me apaixonar pela imagem que deixaste, percorrendo o único pedaço de chão que pisaste ou agarrando-me aos beijos que em vão me destes. Beijos que já não são nossos. São do porto que te levou e do bordou que te abandonou. Do mar que nunca e meu e sempre e daquele que o há-de ter...
Roubei a vontade de navegar ao mar
vontade fervorosa de me abater em tua fronte rochosa
sou o sal que abandonado se entrega ao passado
pescador em terra, nesse mar que me encerra
...Dispo o sal que me cobre sem saborear
a fina areia que me cobre o rosto em desgosto
o cansaço deitado nas ondas embalado
essa tristeza que me consome, e que em meus ombros dorme...
"Soturno Pescador" por VRM
Desafogo saber que voltaste. Que o vento escuro que norteava a minha estrada, era apenas nevoeiro claro que firmava o teu caminho. Ouvia de mansinho os teus pés de prata, aconchegando-me com a sombra que a tua imagem delineava no meu corpo. Tudo são desvarios cansados que formas, sem dizer uma única palavra. Ventos sombreados entre dedos abandonados em recordações pálidas por nunca viverem em si mesmo, cansadas.
Revolto a almofada, símbolo de minha castidade pela tua ausência, e desnudo pensamentos só nossos, entre lençóis ou nas passagens frias que a realidade cria sem sentirmos. E esgotante ter que me apaixonar pela imagem que deixaste, percorrendo o único pedaço de chão que pisaste ou agarrando-me aos beijos que em vão me destes. Beijos que já não são nossos. São do porto que te levou e do bordou que te abandonou. Do mar que nunca e meu e sempre e daquele que o há-de ter...
Roubei a vontade de navegar ao mar
vontade fervorosa de me abater em tua fronte rochosa
sou o sal que abandonado se entrega ao passado
pescador em terra, nesse mar que me encerra
...Dispo o sal que me cobre sem saborear
a fina areia que me cobre o rosto em desgosto
o cansaço deitado nas ondas embalado
essa tristeza que me consome, e que em meus ombros dorme...
"Soturno Pescador" por VRM
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